Zambujeira do Mar (2000), as crebas de Ana Jotta

AnaJottaZambujeiradomar
Na nosa recente estadía en Porto non podía faltar, máis unha vez, a visita ao Museu de Serralves. Museu de Arte Contemporânea, que desta volta ofrecía catro percorridos expositivos ben diferentes entre si. Como queira que non son especialista en arte, senón simple afeccionado, non farei ningún comentario crítico sobre os mesmos, mais darei conta dunha das obras que petou forte no meu interese visual.
Unha das mostras era a colectiva «Pode o Museu ser um jardim?» (06 de fevreiro – 13 de setembro) que amosa unha serie de obras dos fondos do Museu para responderen a esa cuestión. Entre elas atopei unhas crebas (a palabra non existe para o Portal da Língua portuguesa nin para o Vocabulário Ortográfico Comum) da artista Ana Jotta, que intitulou co nome da localidade costeira Zambujeira do Mar.
Esta obra, que nós ollamos noutra disposición (pois esa liberdade consente a autora) figura na Coleção Online (acessível em
http://biblioteca.serralves.pt/),
que «é uma base de dados de consulta pública com uma seleção de obras de arte da Coleção de Serralves». De aquí reproduzo os datos sobre esta obra e a súa autora (e o subliñado en negra é meu).
Zambujeira do Mar, 2000
Dimensões variáveis / Variable dimensions
Alumínio fundido (32 elementos)
Col. Fundação de Serralves – Museu de Arte Contemporânea, Porto. Aquisição, 2006
Jotta, Ana
Nasceu em 1946, Lisboa, Portugal
Zambujeira do Mar é o nome de uma praia do Alentejo, no sul de Portugal, conhecida por ser, desde 1997, o palco de um festival anual de música pop e rock, o Sudoeste, que em agosto apresenta as bandas internacionais do momento. Pouco depois do início desta peregrinação de milhares de jovens, Ana Jotta adquiriu nessa zona uma casa onde passava regularmente temporadas de repouso ? a que outros chamariam jornadas de labor (lembremo-nos de que em vários dos seus trabalhos Jotta inscreve a frase “haverá vida depois do trabalho?”) ?, durante as quais se dedicou a recolher e colecionar madeiras gastas que o mar vai trazendo e que se vão apanhando nos passeios marítimos. Estas madeiras foram depois passadas a alumínio, numa pequena empresa que fabrica sobretudo utensílios de cozinha. Zambujeira do Mar (2000) é constituída por 32 elementos desta “madeira prateada” que podem ser distribuídos no espaço da forma que melhor se adapte ao museu ou à galeria. Por exemplo, na exposição “Rua Ana Jotta”, na Casa de Serralves, em 2005, a obra foi instalada com os seus vários elementos empilhados uns sobre os outros, enquanto em “A Entrevista Perpétua”, apresentada no Edifício Axa, no centro do Porto, em 2012, os mesmos elementos formavam um carreiro. Questionada sobre a forma correta de instalar Zambujeira do Mar, a artista responde: “O curador que decida!” A obra testemunha o interesse de Ana Jotta pelos processos de corrupção (neste caso a erosão provocada pelo mar). É essa atração que a leva a constantemente introduzir no seu trabalho pequenas alterações que constituem afastamentos ou degradações relativamente à pureza, qualidade ou correção de determinados movimentos artísticos. À primeira vista, muitas das suas peças parecem encaixar-se sem atrito nos vários “ismos” (expressionismo, minimalismo, conceptualismo, entre outros) que marcaram o século XX, mas um olhar mais atento revela pequenos mas importantes desvios, que são uma espécie de tradução visual dos jogos de linguagem tão caros à artista, nomeadamente formas deliberadamente erradas de pronunciar ou escrever uma palavra ou locução. Zambujeira do Mar decorre de, e torna evidente, uma outra faceta da prática artística de Ana Jotta: a sua fúria colecionista e apropriadora. A casa de Jotta, repleta, em todas as divisões, do chão ao teto, de objetos da mais variada natureza ? obras próprias e ofertas de amigos artistas, mas sobretudo objetos obsoletos de uso quotidiano, artesanato, brinquedos, souvenirs, curiosidades de todos os cantos do mundo ?, é obra de uma verdadeira artista-colecionadora, desejosa de recriar no ambiente que a rodeia uma versão condensada do mundo.
A maiores, engado un breve comentario da revista dixital artecapital:
«Ana Jotta evoca, igualmente, a ideia de coleccionismo na obra Zambujeira do Mar (2000), onde metalizou uma série de objectos desgastados que foi recolhendo da praia, concedendo-lhes uma perpectuação e regeneração. Nesta obra, o acto de coleccionismo expede tanto para a recolha das peças, como para uma subversão do conceito de autoria, pois é dada autonomia a cada curador para agrupar as peças conforme entender».
E finalmente, para rematar, do pdf que acompaña esta exposición colectiva reproduzo o poema «O jardim» de Sophia de Mello Breyner Andresen.
O JARDIM
O jardim está brilhante e florido.
Sobre as ervas, entre as folhagens,
O vento passa, sonhador e distraído,
Peregrino de mil romagens.
É Maio ácido e multicolor,
Devorado pelo próprio ardor,
Que nesta clara tarde de cristal
Avança pelos caminhos
Até os fantásticos desalinhos
Do meu bem e do meu mal.
E no seu bailado levada
Pelo jardim deliro e divago,
Ora espreitando debruçada
Os jardins do fundo do lago,
Ora perdendo o meu olhar
Na indizível verdura
Das folhas novas e tenras
Onde eu queria saciar
A minha longa sede de frescura.
Sophia de Mello Breyner Andresen, in Dia do Mar (1947), 7.a ed., Lisboa: Assírio & Alvim, 2014.

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